Estudo vai avaliar os possíveis efeitos da exposição dos animais aos nanoplásticos

Pesquisadores pretendem identificar danos causados por esses nanomateriais em tecidos e órgãos dos animais e correlacioná-los a possível bioacumulação desses poluentes (Foto: Fapeg)

O plástico leva entre 400 e 500 anos para se decompor na natureza. Ele se quebra e se fragmenta em pequenas partículas a partir de objetos plásticos maiores descartados no ambiente. No entanto, quando degradadas, as partículas de dimensões micro e nanométricas podem se acumular no ambiente e induzir prejuízos à biodiversidade. Tecnicamente, a literatura distingue os resíduos plásticos presentes no ambiente em duas grandes categorias de poluentes emergentes: macroplásticos (>5 mm) e microplásticos (<5 mm). Porém, recentemente o termo “nanoplástico” foi introduzido como uma categoria separada, a qual engloba partículas de plásticos menores que 0,2 mm com base na classificação de tamanho do Working Group on Good Environmental Status (WG-GES) e menor que 100 nm de acordo com a definição geral usada para nanomateriais.

Também como partículas já inicialmente sintetizadas em pequenos diâmetros, presentes, por exemplo, em pellets de resinas plásticas e/ou microesferas utilizadas em produtos de higiene e cosméticos como sabonetes, cremes, pastas, esfoliantes, os nanoplásticos podem adentrar nos sistemas aquáticos e terrestres. Após o uso, esses materiais caem na rede de esgoto e por serem partículas muito pequenas não são retidas pela filtragem nas estações de tratamento e acabam indo parar nas águas de rios, lagos, lagoas e mares.

Quando ‘escapam’ para o meio ambiente, os nanoplásticos  também podem atuar como captador de poluentes orgânicos persistentes (POPs), tais como os pesticidas e compostos químicos industriais, altamente nocivos aos organismos. Ao perdurarem por muito tempo no ambiente, eles podem ser ingeridos por diferentes organismos e entrar na cadeia alimentar, participando inclusive da dieta humana.

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A preocupação de que esses poluentes possam impactar os organismos têm impulsionado o desenvolvimento de vários estudos no mundo. Utilizando os nanoplásticos de poliestireno (PS NPs) como representantes dos NPs, já que são um dos polímeros mais produzidos e utilizados mundialmente, além de já terem sido identificados em ambientes aquáticos, o doutor em Bioquímica pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, Fernando Postalli Rodrigues, teve sua proposta de pesquisa aprovada na Chamada Pública nº 06/2020 para seleção de bolsistas no âmbito do Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (PDCTR). O estudo será conduzido no Instituto Federal Goiano – Campus Urutaí e será supervisionado pelo Prof. Dr. Guilherme Malafaia. A chamada foi lançada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (Fapeg) em parceria com o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

O projeto de Postalli propõe avaliar os efeitos da exposição crônica de modelos experimentais representativos dos grupos de vertebrados de distintos habitats ecológicos a nanoplásticos de poliestireno. Os sistemas-modelo a serem utilizados serão: Danio rerio (zebrafish) e girinos  como representantes aquáticos, e a Coturnix coturnix japonica (codornas japonesas) e o Mus musculus (camundongos Swiss), como representantes terrestres, garantindo boa representatividade ambiental em relação aos animais experimentais.

“Vamos estudar a exposição de peixes, girinos, codornas e camundongos avaliando biomarcadores de toxicidade crônica, o comportamento destes animais quando submetidos a distintos testes e paradigmas. Também iremos identificar danos causados por esses nanomateriais em alguns dos principais tecidos ou órgãos dos animais experimentais que nos permitam correlacioná-los às alterações comportamentais hipotetizadas”, explica Postalli. Segundo ele, também será realizada uma investigação mais específica sobre os mecanismos de ação dos nanoplásticos em nível celular e molecular a partir de análises de espectromicroscopia FT-IR em ensaios conduzidos in vitro.

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Postalli destaca a enorme lacuna do conhecimento sobre a (eco)toxicidade desses poluentes emergentes quando presentes em ambientes terrestres e, principalmente, aquático dulcícola. “Conforme podemos observar pela literatura científica, a exposição dos organismos a microplásticos desencadeia uma ampla variedade de danos tóxicos, incluindo prejuízos alimentares, ao desempenho reprodutivo, perturbações no metabolismo energético, alterações hepáticas, bem como ação sinérgica, aditiva ou antagônica de outros contaminantes orgânicos hidrofóbicos, dentre outros. Essas evidências têm sido obtidas especialmente por meio de estudos laboratoriais e de campo voltadas ao ambiente marinho, utilizando-se modelos experimentais do grupo dos moluscos, crustáceos, anelídeos e dos peixes. Agora, o nosso estudo visa compreender como são afetados os vertebrados pelos nanoplásticos, especialmente  no sistema de água doce”, explica o pesquisador.

Em busca de respostas

Qual a toxicidade dos nanoplásticos em vertebrados que vivem exclusiva ou parcialmente em ecossistemas de água doce ou que deles obtêm fonte hídrica? Quais são as consequências biológicas da exposição aos NPs? Onde esses NPs se acumulam nos organismos e que danos eles causam? Como esses NPs agem nos sistemas fisiológicos? “Acreditamos que a compreensão inicial dessas questões contribua sobremaneira para o direcionamento de estratégias específicas de remediação e mitigação dos impactos causados por esses nanomateriais, quando presentes nos ecossistemas dulcícolas”, ressalta Fernando Postalli.

A partir do pressuposto de que os PS NPs estão presentes em diferentes ambientes e que seus impactos sobre os animais ainda são pouco compreendidos, o objetivo geral do projeto, segundo o pesquisador, será avaliar os efeitos da exposição crônica (60 dias) de distintos vertebrados a esses poluentes (em concentrações ambientalmente relevantes), a partir de variados biomarcadores de toxicidade. “Embora a toxicidade de muitos nanomateriais presentes nos ecossistemas aquáticos já tenha sido relatada, em vários modelos animais, o conhecimento sobre os possíveis efeitos da exposição a nanoplásticos é muito limitado,” destaca.

Fernando Postalli esclarece que os ensaios da pesquisa obedecem aos padrões de boas práticas laboratoriais, seguindo as competências da CUEA (Comissão de Ética no Uso de Animais). “No estudo, os modelos animais serão expostos ao nanoplástico por um período de 60 dias, sob concentração variável (definidos em pré-estudos); este tempo prolongado, foi definido porque os riscos toxicológicos derivados da exposição a baixas concentrações e baixo período de tempo de exposição aos poluentes não resultam (não resultaram em estudos de previabilidade) em efeitos toxicológicos, preterindo, assim, a utilização de maiores concentrações em períodos mais prolongados de exposição”, explica o pesquisador.

Os trabalhos

Segundo ele, para avaliação da toxicidade serão aplicados biomarcadores comportamentais como, teste de preferência social e teste de defesa antipredatória, bem como teste de locomoção e agregação social. Biomarcadores histopatológicos, mutagênicos, bioquímicos e de bioacumulação completam o estudo que possui avalições de toxicidade, citotoxicidade, genotoxicidade, bioquímicas e fisiológicas, contemplando um estudo de caráter multidisciplinar. Também serão realizados estudos in vitro, buscando compreender os mecanismos de ação dos NP-PS em nível celular/molecular.

Uma abordagem metodológica inovadora utilizada na pesquisa vai permitir a identificação de alterações bioquímicas não detectadas por ensaios químico-bioquímicos clássicos, a partir da coleta de milhares de espectros de infravermelho, em uma análise espaço-temporal que origina mapas químicos e imagens químicas. Todos os dados obtidos serão analisados via testes estatísticos que poderão englobar testes de médias simples até análise dos componentes principais, explica o pesquisador.

Expectativas

Fernando Postalli destaca que, além de contribuir para ampliar o conhecimento sobre a toxicidade das NP-PS em representantes do grupo dos vertebrados (peixes, anfíbios, aves e mamíferos), a fim de subsidiar inferências do impacto (eco)toxicológico desse poluente emergente nos ecossistemas de água doce, a Chamada Pública tem grande relevância, pois ofereceu a oportunidade de mobilidade do proponente para o Estado de Goiás, oportunizando sua interiorização e fixação na região, através do seu engajamento nas pesquisas desenvolvidas no IF Goiano.

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Pesquisador Fernando Postalli

Para Postalli, a pesquisa também vai contribuir para o fortalecimento do Núcleo de Pesquisa em Ciências Ambientais e Biológicas do Instituto Federal Goiano (IF Goiano), “bem como para a nucleação de novos grupos de pesquisa, especialmente, por meio da rede de colaboradores estabelecida para o desenvolvimento da presente proposta”. A pesquisa vai ainda contribuir para a formação científica de pelo menos um estudante de iniciação científica e dois mestrandos do PPG em Conservação de Recursos Naturais do Cerrado que vão participar diretamente do desenvolvimento do projeto, fortalecendo o PPG e o PIBIC da instituição.

Publicar pelo menos cinco artigos científicos em revistas qualificadas na área de Ciências Ambientais (estrato A1/Qualis/CAPES e fator de impacto > 4,0); e fortalecer as parcerias institucionais estabelecidas no âmbito deste projeto, por meio da geração de conhecimentos sobre o impacto da exposição crônica a nanoplásticos, publicações científicas, intercâmbio de estudantes, troca de experiências e aperfeiçoamento de procedimentos metodológicos, estão entre as expectativas que o projeto poderá oferecer, segundo Fernando Postalli.

Fernando Postalli veio de Londrina, Paraná, e vai desenvolver seus experimentos no Laboratório de Pesquisas Biológicas do IF Goiano de Urutaí-GO sob supervisão do professor doutor Guilherme Malafaia Pinto e com a colaboração direta de alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado.

O laboratório possui ampla experiência com experimentos comportamentais e bioquímicos / fisiológicos e conta com equipe treinada de alunos e técnicos. http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/33676 .

Publicar pelo menos cinco artigos científicos em revistas qualificadas na área de Ciências Ambientais (estrato A1/Qualis/CAPES e fator de impacto > 4,0); e fortalecer as parcerias institucionais estabelecidas no âmbito deste projeto, por meio da geração de conhecimentos sobre o impacto da exposição crônica a nanoplásticos, publicações científicas, intercâmbio de estudantes, troca de experiências e aperfeiçoamento de procedimentos metodológicos, estão entre as expectativas que o projeto poderá oferecer, segundo Fernando Postalli.

Fernando Postalli veio de Londrina, Paraná, e vai desenvolver seus experimentos no Laboratório de Pesquisas Biológicas do IF Goiano de Urutaí-GO sob supervisão do professor doutor Guilherme Malafaia Pinto e com a colaboração direta de alunos de iniciação científica, mestrado e doutorado.

O laboratório possui ampla experiência com experimentos comportamentais e bioquímicos / fisiológicos e conta com equipe treinada de alunos e técnicos. http://dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/33676 .

Colaboradores

O projeto conta com a colaboração de vários laboratórios e pesquisadores: Jesiel Freitas Carvalho, do Centro Regional para o Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Crti/UFG), e do Laboratório Multiusuário de Microscopia de Alta Resolução (LabMic/UFG); Simone Maria Teixeira de Sabóia Morais, do Laboratório de Comportamento Celular(UFG); Thiago Lopes Rocha, do Laboratório de Biotecnologia Ambiental e Ecotoxicologia (LaBAE/UFG); Boniek Gontijo Vaz, do Laboratório de Cromatografia e Espectrometria de Massas (LaCEM/UFG); Andréa Rodrigues Chaves, da Central Analítica do Instituto de Química/UFG; Roberto Santana da Silva, do Laboratório de Química Analítica e Bioinorgânica (Bioinorganic Chemistry/USP).

Chamada Pública

 A Chamada 06 / 2020 para a Seleção de Bolsistas no âmbito do Programa de Desenvolvimento Científico e Tecnológico Regional (PDCTR) tem por objeto reduzir as desigualdades regionais e estimular a mobilidade e a fixação de doutores com experiência em ciência, tecnologia e inovação e/ou reconhecida competência profissional em instituições ou empresas, públicas ou privadas, de ensino superior (IES) e/ou de Ciência, Tecnologia e Inovação (ICTI) para atuarem no Estado de Goiás nas vertentes regionalização e interiorização.

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“Esta excelente iniciativa contempla jovens doutores e doutores experientes a terem a oportunidade de mostrar o seu trabalho especializado como pesquisador, ainda que não estejam concursados e / ou vinculados ao mercado de trabalho, oportunizando o exercício de suas competências com pesquisa de alto impacto científico em instalações e laboratórios de pesquisas do estado de Goiás”, comenta Fernando Postalli. Para ele, a Chamada Pública tem grande relevância, pois ofereceu a oportunidade de mobilidade para o Estado de Goiás, promovendo a interiorização e fixação na região, através do engajamento nas pesquisas desenvolvidas no IF Goiano.