Negócios com bioinsumos ganham espaço nas lavouras goianas
Na safra 2020/2021, o mercado de bioinsumos registrou R$ 1,7 bilhão em negócios no Brasil, alta de 37% em relação ao volume comercializado na safra 2019/2020. O levantamento é da Spark Inteligência de Mercado. A consultoria aponta que, na região de Goiás e do Distrito Federal, 16% da área cultivada de soja, 42% de feijão e 96% de algodão receberam algum tipo de biodefensivo.
“Notamos uma oferta crescente de tecnologias safra após safra. A necessidade de o produtor utilizar defensivos agrícolas com diferentes modos de ação, químicos e biológicos, para conter a resistência de fungos e pragas a determinados ativos, favorece igualmente o aumento da participação dos bioinsumos”, analisa o sócio-diretor da Spark, André Dias.
Nesse cenário de evolução no campo, Goiás se destaca por ter sido o primeiro Estado a criar um programa de incentivo ao uso de bioinsumos nas lavouras. Elaborado por meio da Secretaria de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Seapa) e instituído em maio de 2021 (Lei Estadual nº 21.005/2021), o Programa Estadual de Bioinsumos visa ampliar e fortalecer a adoção de práticas para a evolução do setor agropecuário, com a expansão da produção, do desenvolvimento e da utilização de bioinsumos e sistemas sustentáveis.
“Com tecnologia, ciência, informação e desenvolvimento de bioinsumos, vamos reduzir o custo e melhorar o sistema de produção no Estado. É Goiás no caminho para se tornar um dos melhores do mundo na agropecuária sustentável”, destaca o governador Ronaldo Caiado.
O titular da Seapa, Tiago Mendonça, reforça que o programa coloca mais uma vez Goiás na vanguarda de ações voltadas ao fortalecimento do setor agropecuário. “Nossa legislação favorece uma produção de baixo impacto ambiental. Com a diminuição do uso de químicos, temos alimentos de melhor qualidade para fornecer não só aos brasileiros, mas ao mundo. Esta é uma preocupação forte do governador Ronaldo Caiado e da Seapa”, explica.
O coordenador-geral do Programa Nacional de Bioinsumos do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Alessandro Cruvinel Fidelis, elogia a visão moderna e inovadora do Estado. “A iniciativa da Secretaria de Agricultura de Goiás é um exemplo que dou em todas as apresentações e provocações que faço em outros Estados. Minas Gerais está praticamente copiando o modelo de Goiás, o Distrito Federal também, e outros estão seguindo o exemplo”, diz.
Segundo Fidelis, desenvolver os programas estaduais é uma das prioridades do Governo Federal. “As coisas acontecem nos Estados e municípios, e as especificidades regionais são muito importantes para políticas públicas assertivas”, afirma.
Ele elenca que entre os desafios para a expansão do uso de bioinsumos estão avanço nas questões regulatórias de processos e produtos para dar mais segurança jurídica aos produtores e às indústrias, desenvolvimento de modelos para agricultores familiares e pequenos empreendedores rurais e fazer as informações dos benefícios chegarem a todos. “A gente sabe que essa chave vai virar, mas a velocidade com que isso vai acontecer depende da nossa capacidade de ajudar a catalisar o processo”, resume.
Superintendente de Produção Rural Sustentável da Seapa, Donalvam Maia lembra que durante muito tempo a sustentabilidade foi uma pauta exclusivamente ambiental. “Hoje o mundo inteiro percebe que sustentabilidade é uma pauta ambiental e econômica. Aliadas, essas duas pautas produzem alimentos cada dia mais saudáveis, podendo ter um custo menor e também preservar o meio ambiente para as próximas gerações”, ressalta. “A Lei Estadual de Bioinsumos vem para poder incentivar essa produção, seja on farm (dentro da fazenda) ou com os chamados produtos de prateleira. O importante é que eles ganhem volume e circulem no Estado”, completa.
O programa está desenvolvido pelo Governo de Goiás – por meio da Seapa, Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (Emater), Secretaria da Retomada, Secretaria de Desenvolvimento e Inovação (Sedi), Fundação de Amparo à Pesquisa de Goiás (Fapeg) e Universidade Estadual de Goiás (UEG) -, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) – unidade Arroz e Feijão, Universidade Federal de Goiás (UFG), Instituto Federal Goiano (IF Goiano), Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar Goiás), Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS), Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), Associação Goiana de Produtores de Algodão (Agopa), Associação dos Produtores de Soja de Goiás (Aprosoja), entre outras.
Ações em campo
Por meio da atuação conjunta de entidades envolvidas no programa e de investimentos no setor, a pesquisa de insumos biológicos em Goiás deve ganhar o reforço de 13 biofábricas a partir deste ano. A previsão é de R$ 8 milhões para o desenvolvimento e a disseminação da tecnologia. O grupo que integra as instituições parceiras definiu 27 objetivos estratégicos para os próximos meses, sendo um deles o de abrigar em Goiás o maior ecossistema de inovação em bioinsumos do Brasil.
Os equipamentos para as biofábricas começarão a ser adquiridos no primeiro semestre de 2022, com recursos do Tesouro Estadual. Nove biofábricas serão instaladas em unidades do IF Goiano, no interior do Estado; duas na Universidade Estadual de Goiás (UEG), em Anápolis; e mais duas na Universidade Federal de Goiás (UFG), em Goiânia. A UEG prevê ainda o aporte de recursos em uma linha de pesquisa específica sobre bioinsumos.
Além de investimentos, equipes da Seapa e de outras entidades envolvidas no programa visitarão fábricas e fazendas modelo no Estado que já utilizam bioinsumos nos processos de produção. No dia 18 de fevereiro, representantes da Secretaria de Agricultura acompanharam uma comitiva formada por integrantes do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), Companhia do Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba (Codevasf) e Sebrae Nacional, em visitas a casos de sucesso na área de bioinsumos no município de Jataí, na região Sudoeste do Estado.
Eles estiveram na SoluBio Tecnologias Agrícolas e em uma fazenda modelo, com o objetivo de sensibilizar o MDR a apoiar o Programa Estadual de Bioinsumos, dentro de possíveis novas Rotas de Integração Nacional fomentadas pelo governo federal.
Antes, no dia 16 de fevereiro, equipes da Seapa estiveram em Rio Verde, também na região Sudoeste do Estado, para alinhar ações com foco na produção e utilização de bioinsumos. A pauta trouxe, ainda, discussões acerca da realização do 8º Encontro Técnico de Agricultura Sustentável, que deverá ocorrer em abril deste ano.
Exemplo
De Rio Verde, na região Sudoeste de Goiás, vem o exemplo do produtor rural Paulo Roberto Buffon, que começou a utilizar bioinsumos em 2005. Após plantios sucessivos de soja e milho, a crescente presença de dois fungos de solo (Rhizoctonia e Fusarium) se transformou em uma dor de cabeça para o empreendedor. Como os tratamentos químicos não surtiam efeito, ele precisou buscar alternativas. Com o apoio do pesquisador Murillo Lobo, da Embrapa Arroz e Feijão, Buffon experimentou utilizar um terceiro fungo (Trichoderma) para impedir o avanço do Rhizoctonia e do Fusarium. “Os resultados foram impressionantes. Nos anos seguintes ampliamos a utilização para o controle do mofo branco da soja (Sclerotinia), com excelentes respostas”, conta, entusiasmado.
Em 2013, Buffon inaugurou uma fábrica de bioinsumos em sua propriedade. O espaço foi equipado com dois conjuntos de tanques, cada um com três reservatórios. Ele reforça que esta é a primeira safra em que trabalha com 100% de produto biológico no sulco. “Já suprimimos o uso de fungicidas no tratamento de sementes da soja. No milho faremos este mesmo processo. Estamos trabalhando com aplicação em cobertura nestas áreas, e temos uma área de teste de 80 hectares, onde queremos chegar a 100% de uso de produtos biológicos”, detalha ele.
Entretanto, o produtor acredita que tentar substituir completamente o controle químico pelo biológico pode acabar em frustração e estigmatizar as tecnologias de bioinsumos. Em vez disso, destaca ele, é melhor pensar numa lógica de manejo diferente e integrada. “A agricultura convencional trouxe desenvolvimento a todas as regiões e manteve o Brasil em posição de destaque como fornecedor mundial de alimentos. Esse modelo adota atributos de produção em massa e desconsidera por completo o contexto local, as circunstâncias da lavoura e a integração da paisagem. O cultivo se torna mais fácil, pois existe um protocolo de aplicações químicas pronto antes mesmo do início da cultura. Mas a ineficiência do sistema pode ser muito elevada e diminuir a rentabilidade do produtor. A lavoura é um sistema vivo, e deve ser tratada em suas especificidades”, argumenta.
De acordo com ele, a utilização frequente de insumos biológicos propicia maior equilíbrio entre os microorganismos presentes no sistema. “Como benefícios para o sistema produtivo, temos a redução do uso de defensivos químicos, presença mais frequente de inimigos naturais, maior proteção do meio ambiente, menor risco aos colaboradores no manuseio dos produtos e a produção de alimentos mais saudáveis”, cita ele. Além de empresário rural, Buffon, que é engenheiro agrônomo por formação, ocupa o cargo de diretor do Grupo Associado de Agricultura Sustentável (GAAS), entidade que compartilha conhecimento e experiência com outros produtores, instituições e governos.